LAGOA MALBA



A Lagoa Malba é uma lagoa fundamental para o estudo da ecologia e limnologia dos lagos do médio rio Doce. Essa afirmativa baseia-se no fato de que ela é uma das poucas lagoas da região cuja estrutura de sua comunidade de peixes aproxima-se da fauna de peixes que habitava a maioria dos lagos da região antes de sofrerem os devastadores impactos das introduções de espécies tais como o tucunaré, a piranha, a tilápia, o bagre africano, dentre outras. Além disso, a lagoa Malba é um lago proporcionalmente grande e com morfometria complexa apresentando vários compartimentos distintos. Apesar de ter uma fauna de peixes ainda pouco disturbada, ela vem sofrendo bastante com inúmeras intervenções sendo feitas em suas margens: estradas vicinais, monocultivos de Eucalyptus, etc. Um aspecto que foi evidenciado de modo particular em nossa pesquisa é o fato de que essa lagoa teve provavelmente o seu nível original aumetado (alterado) em aproximadamente 2,5 m provavelmente em decorrência da construção de estradas vicinais para acesso aos talões de Eucalyptus.

Figura 1 - Quatro diferentes aspectos da Lagoa Malba, médio Rio Doce. Essa lagoa está localizada na porção norte do distrito, muito próxima à calha do rio Doce. A Lagoa está situada em uma bacia de drenagem totalmente ocupada por monocultivos de Eucalyptus. Ela provavelmente sofreu, em passado recente, uma abrupta elevação do nível da água o que causou a formação de paliteiros submersos numa situação semelhante a vista em muitos reservatórios brasileiros. Os paliteiros (vegetação arbórea morta) podem ser vistos em várias partes ao longo da zona litorânea do lago. Apesar desses impactos, entendemos que esse ecossistema deva ser objeto de uma intensa campanha ambiental visando a preservação da estrutura da comunidade de peixes. A lagoa Malba pode ser um belo exemplo de como as áreas do entorno de uma unidade de conservação (no caso o Parque Estadual do Rio Doce, PERD) devem estar plenamente inseridas em seu plano de manejo. Conservar a biodiversidade que existe no PERD implica em conservar a riqueza de peixes na Lagoa Malba!

A pesquisa hidracústica na Lagoa Malba foi realizada no dia 26 de junho de 2008. Testamos especificamente a seguinte hipótese: - se a Lagoa Malba é uma lagoa isenta de piranhas e tucunarés, então as densidades de larvas de dipteros chaoboridae devem ser muito baixas. Essa predição decorre de uma teoria recentemente proposta em publicação para breve (Pinto-Coelho et cols. BJB, no prelo) quando propusemos que a introdução de espécies piscivoras de grande porte tais como o tucunaré ou a piranha do pantanal estariam causando um "relaxamento das tensões ecológicas" no zooplâncton. Em decorrência, essas introduções, ao dizimarem a ictiofauna nativa causaram, em primeira linha, uma enorme depressão nas pressões de predação por vertebrados (peixes) em diversos componentes do zooplâncton. Assim, as larvas do diptero Chaoborus ficaram - de repende - totalmente livres da predação por pequenos peixes, principalmente os lambaris, e sofreram uma "explosão populacional".

Estamos ainda propondo que o relaxamento ecológico verificado nos lagos logo após a introdução dos peixes piscívoros e exóticos levou a uma completa reestruturação da cadeia limnética, com o aparecimento de um processo tido como "cascata trófica invertida" que, em nosso entendimento, leva, em última análise, a uma radiação de extinções locais (principalmente de copépodes calanoides) e a um incremento de eutrofização sem necessidade de aporte externo de nutrientes já que há uma capitalização da biomassa algal graças a uma queda de eficiência nas taxas de grazing (forrageamento do zooplâncton herbívoro) do zooplâncton lacustre.

Foi com uma enorme alegria e mesmo até com uma certa emoção que pudemos constatar as nossas predições! A Lagoa Malba é um ambiente onde as densidades de dipteros chaoboridae são baixíssimas! Eles estão praticamente ausentes nos nossos ecogramas feitos na lagoa Malba (Fig. 2). Esse padrão constrata de modo agudo com o que foi observado nas lagoas D. Helvécio, Carioca, Jacaré e Águas Claras onde a dominância de Chaoborus é uma constante. Esse achado confirma - de uma maneira exemplar - as nossas predições e prova - de modo inconteste - que a nossa teoria sobre o "relaxamento ecológico" dos dipteros chaoboridae ocorrido em muitos lagos da região é um fato irrefutável. E mais: o estudo desses dipteros é uma necessidade absolutamente fundamental para o entendimento da ecologia de todos os sistemas lacustres do médio rio Doce e possivelmente de muitos lagos e reservatórios dos neotrópicos. O reconhecimento da enorme importância dos dipteros chaoboridae é claramente um novo paradigma para a limnologia dos neotrópicos.

Figura 2 - Perfil da coluna de água e dos sedimentos da lagoa Malba, em excursão realizada no dia 26 de junho de 2006. As linhas verticais em azul claro referem-se aos pontos onde foram tomadas as profundidades, georeferenciadas nesses dois perfis. Os sedimentos do lago estão representados nas cores preto, vermelho e verde. No perfil acima podem ainda serem vistos paliteiros remanscentes da vegetação arbórea que foi submersa por ocasião das alterações verificadas no nível da água do lago. Dados obtidos com a sonda hidroacústica Biosonics DT-X e pós-processados com o software VTB.



O esquema abaixo (retirado de Pinto-Coelho et cols. (in press) Inverted trophic cascade in tropical planktonic communities: increase of eutrophication as a consequence of exotic fish introduction in the lacustrine district of Rio Doce, Minas Gerais, Brazil. Brazilian Journal of Biology (São Carlos, Brasil). procura ilustrar os principais mecanismos que fazem com que as populações do díptero Chaoborus aumentem as suas densidades médias nos lagos que sofrem os impactos das introduções de tucunarés e piranhas. Acreditamos que agora já existe suficiente suporte teórico para que sejam tomadas pelo poder público medidas urgentes visando a reconstituir a saúde ecológica desses ambientes.







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Última atualização em 16 de agosto de 2017
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